Quando se fala em trabalho escravo, muita gente imagina aquele aprendido nos livros de História e encerrado pela Lei Áurea, em 1888. O fato é que, com a evolução das legislações trabalhistas em todo o mundo, também mudou – ou ampliou-se – o conceito de trabalho escravo e hoje se aplica a todo tipo de trabalho forçado ou de pessoas em situação análoga à escravidão.
O foco das legislações trabalhistas é, sempre, garantir condições dignas de trabalho e o bem-estar e a integridade do trabalhador. Na mesma medida, quanto mais distante disso, mais próximo à escravidão um trabalho estará. Para que não haja dúvidas, a legislação brasileira – O Brasil é signatário da Convenção Americana de Direitos Humanos, do Pacto de San Jose da Costa Rica, e das Convenções 105 e 29 da Organização Internacional do Trabalho, em que se compromete a abolir toda forma de trabalho forçado ou obrigatório –, traz bem claras suas definições e sanções.
O Código Penal, por exemplo, define como trabalho escravo, ou condição análoga, aquele em que o trabalhador é submetido a trabalhos forçados ou à jornada exaustiva, sob estas condições, a pena vai de dois a oito anos de prisão, podendo dobrar se o crime for cometido contra crianças e adolescentes ou por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.
Em outro artigo, o Código também define como crime frustrar, com fraude ou violência, qualquer direito assegurado pela legislação trabalhista. Neste caso, a pena de detenção vai de um a dois anos de prisão, com multa, além da pena correspondente à violência.
Identificando empresas ligadas ao trabalho escravo
Não são poucos os casos de empresas brasileiras criminalizadas por ligação, direta ou indireta, com o trabalho escravo. Além de responderem às responsabilizações judiciais, estas empresas passam a fazer parte da chamada Lista Suja – um cadastro criado pela Portaria Interministerial, do Ministério do Trabalho e Emprego e pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Ela enuncia regras sobre a atualização semestral do Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravo.
Uma vez incluída na lista, a empresa passa a ser monitorada pela Fiscalização do Trabalho por um período de dois anos. Somente depois deste prazo, e com a confirmação de que não houve reincidência, o nome da empresa será excluído do cadastro.
Canal de denúncias
A relação com o trabalho escravo pode ser indireta, já que pode também envolver terceiros e fornecedores da empresa. Daí a importância de se manter informado sobre as atividades de toda a cadeia de produção.
Um dos meios mais eficientes de se fazer isso é manter um canal de denúncias independente, que permita à empresa se certificar que os fornecedores que ela está contratando não utilizam trabalho escravo. Grande parte das denúncias levadas a cabo atualmente foram feitas a partir de canais dedicados a esta finalidade, que têm se mostrado eficientes no controle e na forma de conduzir as relações das empresas com terceiros, trazendo para conhecimento interno informações importantes, permitindo que o assunto seja solucionado antes que se torne público, evitando prejuízos de imagem e financeiros.
Casos de trabalho escravo no Brasil
Odebrecht
Entre 2011 e 2012, 400 brasileiros foram levados para trabalhar nas obras da usina de açúcar e etanol Biocom, que pertence à Odebrecht, em Angola (África). A investigação teve início em 2013, devido a denúncias pelos trabalhadores. Muitos adoeceram, alguns com suspeita de febre tifoide, em razão da falta de condição de higiene. Por exemplo, os trabalhadores reclamavam que os banheiros eram distantes do local de trabalho e permaneciam sempre cheios e entupidos, o que os obrigava a fazer as necessidades ao ar livre. Além disso, a água consumida não era potável, e a comida, muitas vezes, estragada.
A 2ª Vara do Trabalho de Araraquara (SP) condenou a construtora Norberto Odebrecht S.A. e as duas subsidiárias por promoverem tráfico de pessoas e por trabalho em condições análogas à escravidão. A penalidade incluiu o pagamento de R$ 50 milhões de indenização por danos morais coletivos, além de uma série de multas, caso a empresa não mude suas práticas.
As partes recorreram da sentença. Contudo, o caso foi encerrado com a conciliação promovida pelo Tribunal Regional do Trabalho. Ficou definido que as empresas condenadas em 1ª instância, pagarão o valor de R$ 30 milhões.
Zara
Em 2011, após 15 trabalhadores que produziam roupas para a marca terem sido resgatados de condições degradantes, a Zara firmou Termo de Ajuste de Conduta (TAC) oferecido pelo MPT em São Paulo, que na época representou um marco na erradicação ao trabalho em condições análogas à de escravidão.
Durante fiscalização do TAC pelo Ministério do Trabalho e Emprego foi constatado o descumprimento de algumas cláusulas, e a rede foi condenada ao pagamento de R$ 5 milhões, que serão revertidos para projetos sociais. Além disso, o MPT entendeu que era necessário rever as cláusulas do primeiro TAC para dirimir dúvidas de interpretação existentes em relação ao acordo original, bem como para fortalecer a responsabilidade jurídica da Zara em sua cadeia produtiva.
Proposto em fevereiro de 2017, o novo termo foi homologado em 10 de maio. Além da ampliação da responsabilidade jurídica da empresa, a Zara está obrigada a fazer a anotação dos contratos de trabalho nas Carteiras de Trabalho e Previdência Social (CTPS) dos empregados prejudicados. Também foi aumentado o valor das multas em caso de novo descumprimento do TAC.
Rumo Logística Operadora Multimodal – Grupo Cosan
A Rumo Logística Operadora Multimodal, empresa do grupo Cosan, foi condenada ao pagamento de indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 15 milhões por submeter motoristas de caminhão a jornadas de trabalho extenuantes, que chegavam a 34 horas.
A ação decorre de dois inquéritos civis instaurados em março de 2015. Na ocasião, o procurador Rafael de Araújo Gomes flagrou um motorista da empresa BNG Transportes, que transportava açúcar para a Usina Santa Isabel, dirigindo há 17 horas, com pequenas paradas ao longo do trajeto.
O Ministério Público pediu em juízo a condenação da Rumo ao pagamento de dano moral coletivo conforme a gravidade do dano causado. De acordo com a fundamentação jurídica da ação, a conduta ilícita da empresa conduz ao reconhecimento do trabalho análogo ao de escravo na forma do artigo 149 do Código Penal.
A juíza que proferiu a sentença anuiu com a argumentação do MPT, afirmando que a prática de jornada exaustiva “tal como constatada nos autos” configura, de fato, o trabalho análogo à escravidão.
Fazendas Seco (MG)
Salário, carteira assinada, água potável, cama, colchão, banheiro.... Nenhum desses aspectos fundamentais relacionados aos direitos humanos eram assegurados na relação de trabalho entre os administradores da Fazenda Seco e o trabalhador José Rodrigues Soares.
Aplicar agrotóxicos em terreno de plantação de eucalipto, sem equipamento de segurança, era sua lida diária. A contrapartida pelo trabalho vinha a cada semana em forma de cesta de alimentos. José Rodrigues Soares foi resgatado da fazenda em força-tarefa do Grupo Móvel, de combate ao trabalho escravo, em junho de 2016, e recebeu todos os seus direitos.
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